Não me perdoo por esta demora. Vinte anos são oportunidades a mais para ter visto este filme. Talvez tenha fugido, por saber que era cruel demais. A realidade mais real que já aprendi e que não foi mais do que “ouvir falar”. Noutros filmes, noutros livros. Impossível, totalmente impossível sentir o que cada pessoa daquelas sentiu, cada gueto, cada campo, cada carruagem, cada fuzilado que contribuiu para os seis milhões. E porquê? Por nada. Por nada que o justifique. Pura loucura, puro extremo, puro radicalismo. O soldado enlouquecido a disparar contra os corpos incinerados. O grito frenético “Schneller!” que cortava mais um pouco da pouca carne que ali havia. O chicote, o gás, o tiro. Certeiro. Assim, de repente, sem ninguém poder olhar. Só nós, do outro lado do ecrã, numa tarde de lazer, numa sala aquecida, pudemos ver. Pagámos para ver. Mas nem por isso sentimos. Do pouco que consegui tremer, fugir à vista ou chorar, que no fundo não foi nada, apreendi mais um pouco das perspectivas. Só perspectivas muito fortes poderiam criar dicotomias daquelas, entre o bem e o mal, a escravidão e a impiedade, a revolta e a compreensão. Do que nos ensinam hoje de tantos lados, é possível sentir pena do Hitler, naturalmente multiplicada infinitamente para o Judeu. Mas mais do que sentir, importa compreender. Hoje tentei. Schindler mostrou que há um caminho para essa compreensão. Porque os olhos dele também tremeram, porque alimentou, porque hidratou, porque aqueceu. Apesar de tudo, Schindler ajudou. Contornou o sistema numa era de pura linearidade. Martirizou-se quando percebeu que o seu carro teria salvo mais 10 pessoas. Então fugiu. Desde então, nem um onze de Setembro faria esquecer uma atrocidade destas. Não foram milhares queimados. Foram milhões. Olhados nos olhos e executados. Assim. De um segundo para o outro. Enquanto os outros continuavam o seu trabalho, aguardando, conformados, o seu destino.
“Sou um membro do partido nazi. Sou um industrial que promove a escravidão. Sou um criminoso. Agora vocês serão libertados, e eu serei perseguido.”
“Sou um membro do partido nazi. Sou um industrial que promove a escravidão. Sou um criminoso. Agora vocês serão libertados, e eu serei perseguido.”
Oskar Schindler
4 comentários:
Atrocidades deste tipo merecem, sem dúvida, um silêncio profundamente sentido. E uma vontade imensa de perseguir sonhos tão diferentes e tão mais simples...e de procurar, incansável e indefinidamente, uma paz interior que nunca existiu em cabeças e em corações de quem as cometeu.
Beijo
Se há coisa que Schindler nos pode ter ensinado é que nada é impossível a partir do momento que acreditamos! E eu acredito em ti, miúda! Bjinhux!*
Também ainda não vi o filme.
Vou ver se arranjo coragem para o fazer...
Beijinhos grandes
O pior Deb, é que nem foram olhados nos olhos. Porque o que lhes fizeram foi o pior. Tiraram-lhes a humanidade. Transformaram-nos em "vermes sem alma", nas palavras do Primo Levi. Ele esteve lá, ninguém melhor que ele para o saber. Agora que já viste o filme, talvez possas ler o livro, "Se Isto É Um Homem". Olha que há palavras que valem mais que mil imagens. ;)
Love*
Enviar um comentário