30 novembro, 2006

Donnerstag - uma particularidade na rotina



À quinta-feira entro em êxtase. Delicia-me fazer parte da Universität Leipzig. E particularmente nesta quinta-feira, quando o Sol de Inverno sob uns toques de nevoeiro se espalha lá fora, sinto que já devia ter descrito há um tempo como é exactamente a minha rotina académica por cá.

À segunda-feira começo por ter uma aula no Studienkolleg, o edifício onde se aprende alemão. A Aula é de Alemão para Ciências Sociais. A Professora é a Frau Tieg, uma mulher muito caricata, típica alemã, que tem umas contas a acertar com a moda e com tudo o que em geral é moderno. Só fala na DDR (República Democrática Alemã) e parece que ainda não vive no tempo do Euro. Mas é sem dúvida culta e esforça-se por nos pôr a debater (auf Deutsch, natürlich), temas de interesse geral para os alunos de várias nacionalidades que ali estudam História, Germanística, Estudos Europeus, Teologia ou Jornalismo (sou a única, como sempre). Fazemos normalmente uma espécie de fóruns porque em cada país a realidade é diferente.

Sigo a correr para o centro, onde me espera a única Vorlesung que visito (eles usam o verbo “visitar” para as aulas). Vorlesung, para os colegas FCSHianos, são as conhecidas aulas em que o auditório se senta a ouvir; aceitam-se atrasos e baldas (aprendi aqui um verbo importante: “schwänzen”, como quem diz fazer gazeta), mas igualmente para os FCSHianos importa referir que o Powerpoint, o microfone e o silêncio são regra. A aula é de Comunicação Política, onde Habermas é citado como cidadão cá da terra, o que não deixa de ser mais interessante. Em todo o caso aproveito o facto de ser a única cadeira em que só se marra para o exame final e por isso vou às aulas só recolher a assinatura e aproveito aquela hora e meia para despachar trabalho de outras cadeiras - no fim vou ver-me grega (ou alemã...), mas não vamos stressar já porque isso é só "para o ano". Naturalmente compreensível a inviabilidade de absorver Habermas, problema suficientemente grave, acrescida do factor “auf Deutsch”, que triplica a gravidade da coisa. Kein Problem!

À terça só tenho aula no Studienkolleg: Alemão em prática escrita. Não havia lugar na turma de nível intermédio, então armei-me em esperta e meti-me na turma de Alemão avançado e fico caladinha o tempo todo porque não percebo metade do que é dito. Mas não deixa de ser interessante: praticamos a escrita de comentários (por exemplo, de discursos melodramáticos de ministros americanos), protocolos, etc.

Quarta-feira é dia de seminário. Bases do Jornalismo Online – no edifício cuja fotografia foi publicada no fotolog mais famoso da blogosfera erásmica. Cerca de 20 alemães e a pobre Tuga sentam-se numa sala com vários computadores, onde assistem aos temidos Referats (as apresentações, para as quais não sou excepção: na próxima quarta é o meu dia, que ontem não houve tempo, sabem, eles entusiasmam-se tanto com as pesquisas que depois fazem Referats de meia-hora quando lhes pedem 20 minutos). Aprendemos as várias particularidades do Ciberjornalismo através dos Referats, cada um tem de escrever um artigo sobre um tema previamente distribuído (calhou-me “Erasmus na Europa de Leste”, vou entrevistar uma alemã que esteve na Polónia e já é jornalista), a ser publicado na Online-Magazin dos estudantes de KMW (Ciências da Comunicação). No fim do semestre ainda há um exame, por isso podem ver como eles gostam de trabalhar.

Tive a infelicidade de escolher um seminário que começa às 8 da manhã a uma sexta-feira. Sair à noite na 5ª, festas WILMA, noite de estudantes, é para esquecer (isto agora soou um pouco Pimpinha Jardim, mas juro que não me sinto a emburrecer por aqui). E apesar de acordar quando ainda é noite (bom, a maior parte do tempo aqui é noite, mas…!) vale a pena, porque Jornalismo Radiofónico é realmente interessante. Não basta ser seminário, ainda é designado de seminário-prático, o que significa que não dá propriamente para parar. Treinamos a pronúncia em estúdio (sim, nem os alemães sabem fazê-la, por isso imaginem a risota que não é verem a Tuga a tentar soar como uma locutora alemã: TOLL!), aprendemos como os textos jornalísticos para rádio devem ser redigidos, somos obcecados pelo chamado O-Ton (os cortes do que os entrevistados dizem para serem colados na peça), aprendemos a mexer no EasyCut, programa radiofónico por excelência e há referats, mas a Professora foi muito querida e livrou-me disso. Isto porque também temos de fazer individualmente 2 reportagens de quatro minutos. A minha primeira, sobre WILMA (sehr interessant) vou montar na próxima segunda-feira: mais um momento de riso se adivinha. Claro que tudo isto em alemão queima os meus neurónios, mas o senhor Rasmus, que ainda por cima trabalha para a rádio da Uni-Leipzig, dá-me uma mãozinha. [Aceitam-se pedidos de envio da reportagem que ele fez na abertura do Mercado de Natal em directo para a rádio, por telemóvel, ao meu lado no meio das barraquinhas. É muito giro viver o Jornalismo in loco, sobretudo quando a velocidade com que eles falam me faz confirmar que o alemão ainda me é muito inacessível!!]

E isto tudo para descrever a particularidade da semana que mais me delicia (em termos académicos, claro…): a Quinta-feira.

Um 9 Uhr
arranca o seminário “Recepção de televisão pelas crianças”. Falamos da pedagogia inerente aos Media e apesar de ser uma cadeira mais teórica, a interactividade entre os 25 alunos (fora a Erasmusstudentin, que prefere ficar caladinha a tirar apontamentos) torna aquela hora e meia muito interessante. Com Referats, powerpoints e acetatos constantemente, a informação a absorver é mais que muita. Mas o que é mais interessante é que em cada Referat os alunos preparam uma selecção de programas televisivos (desde desenhos animados, telenovelas até blocos noticiários e Reality-Shows) a que assistimos e sobre os quais discutimos a partir da perspectiva das crianças. O Referat, no meu caso, será substituído por uma recensão (5 páginas, vá lá) sobre o tema em geral: "Warum die Kinder Fernsehen lieben?" Dá pano para mangas. E não acabou: no fim do semestre tenho de fazer um Hausarbeit sobre um tema específico. Hausarbeit, esse palavrão que inicialmente julgava ser um Hausaufgabe (o chamado TPC). Pois nada a ver: é mesmo um trabalho realizado em casa, em paralelo com a biblioteca e, no meu caso, com o meu dicionário. Tem de ter 15 páginas, o que em alemão, para mim, corresponde a uma tese de mestrado. A ver vamos.

Mas apesar de toda esta carga, a verdade é que saio daquele seminário com uma boa-disposição incrível. Hoje não apanhei o Strassenbahn (eléctrico) porque faço questão de andar todos os dias a pé pelo mercado de Natal um pouco. Mas uma regra mantém-se: passar pela Cafeteria, pedir o meu habitual Doppel-Espresso (que mesmo assim não dá a força de uma boa bica Delta portuguesa, mas é o que se arranja…), organizar a agenda, ler um pouco ou escrever o Diário Erasmus, sair meia-hora depois toda encasacada, apanhar o Strassenbahn, passar no supermercado aqui ao lado de casa, comprar um pãozinho, chegar a casa, fazer umas torradinhas e sentar-me na secretária a trabalhar.

[É verdade, passo muito tempo isolada; ossos do ofício de uma aluna Erasmus abandonada na área de Jornalismo. Mas digam lá que não gostavam de um isolamento assim?]

Agora, se me dão licença, tenho muito que fazer.

26 novembro, 2006

É um pouco como os outros contavam dos Erasmus deles,

mas a cidade, o país, a latitude trazem diferenças.

O aquecimento central engana. Visto o casaco mais curto a pensar que lá fora está agradável como no Zimmer 537. Quando abro a porta para a rua e sinto aquele vento continental geladinho bater na cara, lembro-me que o 5.º andar já está longe. “Que se lixe”.

Alguém trancou a minha bicicleta. Mas não se deixam bilhetes nem 4 piscas nem se buzina. (Há quanto tempo não oiço buzinar?). Tentei simplesmente fazer a minha linda e ferrugenta Fahrrad sair do estacionamento e lá fui eu.

Aqui é tudo “immer gerade aus”. Sem curvas vou parar ao centro e a vantagem da bicicleta é que quanto está verde para os carros vou na faixa dos carros e quanto está verde para os peões vou na faixa dos peões.

Elas ainda não tinham chegado à Augustusplatz. Nem sabia bem com quem me ia encontrar. Uma estudante de Medicina, aus Barcelona, que conhecera no Montagskneipe e que achei muito querida por falar português do Brasil sem dificuldades, convidou-me pelo MSN a ir ver um concerto.

E assim estava eu na Thomaskirche, com três espanholas e uns duzentos alemães à minha volta, num fim de tarde (diga-se, dezasseis horas) de Domingo. Tocou o Coro da Universität Leipzig com Orquestra. Belíssimo. Arrepios, olhos fechados a saborear esta capacidade de dezenas de pessoas conseguirem criar uma musicalidade tão perfeita. E aos poucos começo a acreditar que os músicos sabem quando gostámos do espectáculo, mesmo sem aplaudirmos – porque aqui não se aplaude.

“Wollen wir ein Kaffee trinken?” – Natürlich. Levo a bicicleta pela mão e prendo o cadeado a um qualquer poste ao pé do Coffee Culture. Queríamos o Lukas Café, mas fechava às 18 horas. “Estamos en Alemania…”

“Ich hätte gern ein Espresso und einen Zitronekuchen, bitte”. Que não deu para saborear muito bem. A amiga da Bulgária (num mês fazem-se amigos, aqui) telefonou porque ficou sem Internet. “Vem lá a casa daqui a nada, usas a minha”...

E então, meninas, tive de ir mais cedo. "Scheiβe, já é noite e eu insisto em arriscar andar por aí sem luz na bicicleta. Não há Polizei ao Domingo, hoje não se trabalha na Alemanha", pensei. E de facto a multa sempre sai mais barata do que comprar uma luz nova.

E novamente me fiz ao caminho “immer gerade aus”, com o vento consideravelmente mais gelado, próprio do cair da noite. Estacionei a bicicleta na Tarostraβe, Nummer 12.

Ah, que quentinho que está em casa. “Dling-dlong”. “Maria, es ist für mich“, digo eu à minha Mitbewöhnerin, para se deixar ficar no quarto com os pais e o cão.

A minha amiga búlgara usa a Internet enquanto pinto as unhas e leio qualquer coisa.

“Danke, Débora.”
“Bitte! Janta cá hoje.”

19 novembro, 2006

Saudades da minha Menina


Desta não estava eu à espera.

Lembrar-me da minha Lisboa é como lembrar-me de uma Amiga que estimo demais. E por ela sinto aquelas saudades apertadinhas que dão vontade de chorar.

O paradoxo de estar totalmente afeiçoada às ruas de Leipzig e de sentir uma falta terrível da Júlio Dinis, da praça do Campo Pequeno, do caminho a pé para o Saldanha, do Picoas, do verde triste da Avenida da Liberdade, do Rato, de Campo de Ourique, do Tejo.

Nada substitui a Calçada Portuguesa.
E ainda assim, esta é aquela Saudade que vale a pena sentir. É preciso senti-la para reconhecer as afeições.
Se a virem, mandem-lhe cumprimentos meus.

16 novembro, 2006

Ao fim de dois meses,


não há tempo para descrever tudo o que acontece e se sente.
Acontece de tudo um pouco e sinto-me Bem.

10 novembro, 2006

Eine heiβe Schokolade, bitte.


Este frio consegue ser delicioso.