23 dezembro, 2007

Nosso

O encanto do nosso Inverno não é a neve a contrastar com as casas quentinhas, mas sim o sol longínquo que se vê pintado num céu quase sempre azul. No nosso Inverno vamos a correr tirar as roupas quentes, muitas das quais só se compram nos sítios realmente frios, e enfiamos luvas e cachecóis, chapelinhos bonitos e botas de pêlo sobre as calças. É bom andar assim aconchegadinho, poder dizer "hoje está mesmo frio", fugir aos desalinhos da calçada portuguesa e parar na esquina para comprar uma dúzia de castanhas quentes.

No nosso Inverno sentamo-nos no sofá cobertos de robes, a árvore de Natal cintila ao nosso lado e só apetece ficar em casa. O nosso Natal, esse, é quase igual em todo o lado. O mesmo contraste entre os que têm e os que não têm, os mesmos clichés de Dezembro, os mesmos sacos resultado de encontrões, à pressa, sem pachorra e de última hora. Os mesmos conflitos dentro das famílias, a noite aqui e o dia ali, todos se cruzam entre casas, pelo país e pelo mundo fora. O porquê do Natal, poucos continuam a saber.

Brinde-se no Natal, nos outros dias festivos ou não, neste ou noutro mundo. No nosso País os brindes têm o sabor de um dia de cada vez. E na verdade nós é que sabemos. Pois brinda-se:
- Saúde!
E com ela, esperamos todos cá estar para saborear este céu azul com sol de Inverno, a deixar brilhar a nossa Lisboa melancólica. Com saúde ficam na nossa memória as imagens da nossa Terra, do nosso Natal e do nosso Inverno, aquelas que tanto ajudam a ir e voltar para longe...

14 dezembro, 2007

A caminho

Agora ela gosta de ir, porque habituou-se a ir de repente, a ir andando, a ir embora.

A mesma que não gostava de estar por sua conta, a não ser andando a pé pelas ruas inclinadas de Lisboa, de repente passou a gostar de ir, sem grande aparato.

Não que se tenha habituado a fazer as malas. Continua a não saber como levar tudo o que lhe é importante. Até porque o que é mais importante não conhece aquele “ir”. Apenas embarca psicologicamente com ela...

Descobriu que gosta de ir para o norte, onde o vento e a chuva a obrigam, como sempre diz, a "aconchegar-se no cachecol" para pensar nas suas conquistas. Lembra-se de como foi feliz com temperaturas negativas a baterem-lhe nas faces branquinhas, sem sol.

Já lhe disseram que é próprio dos caranguejos. São caseiros, familiares, e a dada altura resolvem ir andando. Ou voando, se ela for mesmo um passarinho... Talvez ela tenha alcançado essa "altura", no tempo e em si mesma, de ter a vontade grande de ir para descobrir, partir e depois regressar, ver para depois contar. Mas essa é a mesma altura em que os receios se multiplicam. Porque à medida que se habitua a ir, mais normal se torna fazer as malas, e mais difícil passa a ser deixar cá tanta bagagem...