29 janeiro, 2008

Nada de especial

É perfeitamente nítida na memória a admiração que sentia por aquelas histórias contadas. Desde a amiga da irmã que estudava na Escócia, e que eu ouvia sempre com olhar de criança a falar ao telefone em inglês, "que máximo"! Outros amigos, colegas, conhecidos foram fazendo passar a mensagem de terem ido "para fora" trabalhar ou estudar, tinham arranjado namorados e namoradas, vinham "cá" no Natal.
Lá fora é tudo tão longe, tão difícil, pensava eu. Isso é coisa para gente grande.
Até hoje ainda não sei definir como é que eu também fui "lá" parar, mas acho que já desisti de procurar resposta. Foi e ainda é mágico por isso mesmo.
E agora que estou cá, "lá fora", tão longe, parece que não é nada de especial. Quando algo se conquista e se repetem conquistazinhas pequenas a cada dia, tornando a aventura numa nova rotina, parece que uma força idiota nos vai dizendo "vês?, não foi assim tão difícil" e por isso aquilo que eu via como inalcançável afinal já foi conquistado. Venha outra coisa.

NÃO, não é assim que deve ser. E ainda bem que me resta a lucidez para não deixar de valorizar cada dia que tenho deste lado. Seja na West ou na Ostdeutschland. Porque a verdade é que às vezes ainda bloqueio quando, nas arrumações do quarto, oiço vozes da cozinha que me lembram que na minha casa não há mais ninguém que fale a minha língua. A televisão que me ajuda a adormecer fala em alemão, as pessoas na rua falam alemão, tudo é estrangeiro à minha volta.
E é tão boa a sensação. Não só a de estar cá, mas sobretudo a de ter tido a oportunidade de voltar. Voltar a delirar com os escassos metros que separam a minha casa da paragem do autocarro, em que caminho com as mãos nos bolsos, a cabeça agachada, o vapor que sai pela boca a chocar com o frio. "Talvez neve este Carnaval, dão um grau para sábado, QUE BOM."
É proibido subestimar as conquistas diárias que aqui se têm. Mesmo que à minha volta as vivências de outros estrangeiros sejam semelhantes, porque na verdade elas cometem a mesma falha e sabem-no.
Estar aqui é um privilégio, e não me vou permitir nunca deixar de ser grata por isso.

14 janeiro, 2008

Guten morgen!!

9:18 horas da manhã, há ruído em casa.

Eram 7:30 quando o despertador tocou. É dia de aniversário e colei papéis pela parede com votos de felicidades. Ainda estava bem escuro lá fora, mas havia mais pessoas na rua do que vejo agora. Crianças, bicicletas, carros. Ao fundo, a torre da Deutsche Post que me orienta para o estágio rodeia-se de luz azul, cinzenta e cor-de-rosa, adivinhando o nascer do sol por entre as habituais nuvens…

Banho tomado a ouvir uma qualquer rádio alemã, o dia nasce finalmente e às 8:30 tocam à campainha. O senhor para a instalação da Internet disse que viria entre as 8 e o meio-dia. Pois em Portugal teria vindo provavelmente ao meio-dia e qualquer coisa, pelo que por breves instantes ainda me interroguei “quem será a esta hora?”. E ali vinha ele todo lançado a subir os três andares, já a dizer bem alto e com um sorriso “schönen guten morgen!!” como quem se sente realizado quando chega o expediente numa segunda-feira de manhã, bem cedinho.

Entretanto estão dois pãezinhos de sementes, typisch deutsch, no forno. Põe-se roupa da máquina a secar, abrem-se presentes, seca-se o cabelo.

E às 9 horas em ponto, como combinado, chega a Gianna, alemã bem loirinha, para estudar com a Julia no dia do seu aniversário. Quão interessante seria imaginar isso na minha terra – estudar às nove horas em ponto, enquanto se toma o pequeno-almoço e se recebem mensagens de parabéns.

E na volta, nem há compromissos profissionais para hoje. Apenas aqui é assim. A luz é pouca, o ritmo é acelerado, o dia está planeado. Engraçado como entramos nos hábitos de um país assim, tão depressa.

Bom dia!


11 janeiro, 2008

Leipzig X Bonn


Começou a minha nova aventura. Não passei por Mallorca para aterrar em Leipzig; fui direitinha a Köln-Bonn. Três horas de transição, algures no ar, já entre loirões e moreninhos, que vi dissiparem-se depois de recolherem a bagagem. Mais uma vez lá estava eu, com 37 Kg de roupa quente e tudo o que é imprescindível para viver mais uma vez sozinha durante uns meses.

Não fosse a Internet e nada disto teria sido possível. Desde a candidatura ao estágio até à procura de casa. E a Julia das fotografias que vira já estava ali, à minha espera no aeroporto. Pareceu surreal, ao fim de tão pouco tempo, voltar a ouvir esta língua-de-tostas-trincadas em todo o lado, na rua, na rádio, na minha colega de casa com quem desde logo discuti as diferenças óbvias entre West- e Ost- Deutschland.

Só faço questão de descrever a primeira impressão pois a experiência já me ensinou que a entrega à rotina acaba por fazer esquecer aquilo que chamou a atenção em primeiro lugar.

Falta ainda tempo para que a Alemanha pareça mais homogénea – mas bem depressa já ela anda. BMW’s, Mercedes e Volkswagen são a constante que Leipzig não tinha. Até as bicicletas são mais arranjadinhas, bem como quem as pedala. Cabelos apanhados, jovens altas e bonitas, preços consideravelmente mais altos. Nada de críticas, apenas diferenças. Um centro muito simpático, andar a pé para todo o lado, pessoas que de certa forma ainda me são familiares. Entrar num restaurante como quem sai do Inverno e entra no Verão, mesinhas ordenadas com velas acesas em cada uma. Chegam amigos, voltam os apertos de mão de quem me apresenta, novamente, como a “Dê-bô-rrá”. Venham cervejas!!

Preparo-me para trabalhar à séria dentro de dias, ali pertinho do Reno, o amigo do Tejo que vou conhecer ainda hoje e que certamente abafará a saudade de água que Leipzig tão ferozmente alimentava.

No meu quartinho, as minhas coisinhas, as minhas fotografias, aquelas que em Lisboa não são necessárias.

Frio? Quanto baste, para quem acaba de aterrar num novo lar.

E, claro, acordar antes das nove da manhã para aproveitar as poucas horas de sol.

Tschüss!


05 janeiro, 2008

Lá voltar

Resoluções do novo ano? Não há forma de as fazer. Inflação, proibido fumar, saldos, dietas pós época festiva. Se é sempre a mesma coisa, não especulo, afinal, os anos fazem-se de meses próprios, com semanas fugazes mas distintas, dias de sol e de chuva, horas agradáveis e melancólicas.
O grande mês de outrora foi o meu Setembro, Julho revelou-se revelador, Abril detesto-o, Maio nem sempre tem a luz do Tejo, Dezembro está cada vez mais cansativo e cínico.
Janeiro? Não gostava dele. Era frio, escuro e chuvoso. E na volta, quem poderia dizer que me apaixonaria pelo mês do Beyerhaus às segundas-feiras, da fuga da biblioteca em hora de nevão, da bicicleta gelada, do corpo tapado por todo o lado deixando apena a retina estrategicamente de fora. Janeiro, o mês dos aniversários de meio mundo, aqueles aos quais infelizmente faltei (mesmo estando presente), compensando comemorações na festa de anos de um holandês, numa festa de pátria, noutra de fim de semestre.
O Janeiro de 2008? Esse estava escrito numa tal ficha de candidatura, como quem pede um lugar num estágio concorrido seja em que mês for, mas "por favor, o mais depressa possível". E assim voltou a resposta, recordando a rigidez loirinha com aquele "início a 15 de Janeiro, fim a 14 de Março", até com hora marcada...
E assim se planeou a resolução do arranque do novo ano, muito antes das passas, das badaladas, sequer do Natal.
Porque levando os dias com calminha, caseirinhos como tanto gosto, memorizando a rotina, os petiscos e as conversas lisboetas que tanta saudade me trarão, assim me preparei para o 9.º dia, em que um novo avião me levará para uma nova aventura, outra vez por minha conta. Desta vez por vontade própria e, talvez por isso, mais assustadora numa certa perspectiva.
Os medos são os mesmos do herói Setembro, mas agora mais ténues. Uma responsabilidade acrescida pelo factor segunda-a-sexta, horário laboral e rigidez germânica.
Uma nova cidade que só conheço de mapa, com um Tejo emprestado, uma família substituída por uma jovem alemã, estudante de Direito, que conheci pela Internet. Uma equipa de trabalho que visualizei por fotografia, eléctricos quentinhos que me levarão onde preciso, neve (esperemos) a cair no dia-a-dia, derreter em casa, num quarto novo.
Desafios e medos, esses sim, vamos ter de (re)solucionar.
Boa sorte!

01 janeiro, 2008

Para 2008

"venha por favor SAÚDE,

porque o resto depende de nós".