30 setembro, 2009

Diletante muda de aposentos.


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Aguardo visitas dos meus assíduos leitores da deb, diletante!


26 setembro, 2009

Precisa-se de matéria-prima para criar um país

A crença geral anterior era de que Santana Lopes não servia, bem como Cavaco, Durão e Guterres.

Agora dizemos que Sócrates não serve. E o que vier depois de Sócrates também não servirá para nada. Por isso começo a suspeitar que o problema não está no trapalhão que foi Santana Lopes ou na farsa que é o Sócrates.

O problema está em nós. Nós como povo.

Nós como matéria prima de um país.

Porque pertenço a um país onde a ESPERTEZA é a moeda sempre valorizada, tanto ou mais do que o euro.

Um país onde ficar rico da noite para o dia é uma virtude mais apreciada do que formar uma família baseada em valores e respeito aos demais.

Pertenço a um país onde, lamentavelmente, os jornais jamais poderão ser vendidos como em outros países, isto é, pondo umas caixas nos passeios onde se paga por um só jornal

E SE TIRA UM SÓ JORNAL, DEIXANDO-SE OS DEMAIS ONDE ESTÃO.

Pertenço ao país onde as EMPRESAS PRIVADAS são fornecedoras particulares
dos seus empregados pouco honestos, que levam para casa, como se fosse correcto, folhas de papel, lápis, canetas, clips e tudo o que possa ser útil para os trabalhos de escola dos filhos... e para eles mesmos.

Pertenço a um país onde as pessoas se sentem espertas porque conseguiram comprar um descodificador falso da TV Cabo, onde se frauda a declaração de IRS para não pagar ou pagar menos impostos.

Pertenço a um país:


-Onde a falta de pontualidade é um hábito;

-Onde os directores das empresas não valorizam o capital humano.

-Onde há pouco interesse pela ecologia, onde as pessoas atiram lixo nas ruas e, depois, reclamam do governo por não limpar os esgotos.

-Onde pessoas se queixam que a luz e a água são serviços caros.

-Onde não existe a cultura pela leitura (onde os nossos jovens dizem que é 'muito chato ter que ler') e não há consciência nem memória política, histórica nem económica.

-Onde os nossos políticos trabalham dois dias por semana para aprovar projectos e leis que só servem para caçar os pobres, arreliar a classe média
e beneficiar alguns.

Pertenço a um país onde as cartas de condução e as declarações médicas podem ser 'compradas', sem se fazer qualquer exame.

-Um país onde uma pessoa de idade avançada, ou uma mulher com uma criança nos braços, ou um inválido, fica em pé no autocarro, enquanto a pessoa que está sentada
finge que dorme para não lhe dar o lugar.

-Um país no qual a prioridade de passagem é para o carro
e não para o peão.

-Um país onde fazemos muitas coisas erradas, mas estamos sempre a criticar os nossos governantes.

Quanto mais analiso os defeitos de Santana Lopes e de Sócrates, melhor me sinto como pessoa, apesar de que ainda ontem corrompi um guarda de trânsito para não ser multado.

Quanto mais digo o quanto o Cavaco é culpado, melhor sou eu como português, apesar de que ainda hoje pela manhã explorei um cliente que confiava em mim, o que me ajudou a pagar algumas dívidas.

Não. Não. Não. Já basta.

Como 'matéria prima' de um país, temos muitas coisas boas, mas falta muito para sermos os homens e as mulheres que o nosso país precisa.

Esses defeitos, essa 'CHICO-ESPERTERTICE PORTUGUESA' congénita,
essa desonestidade em pequena escala, que depois cresce e evolui até se converter em casos escandalosos na política, essa falta de qualidade humana, mais do que Santana, Guterres, Cavaco ou Sócrates, é que é real e honestamente má, porque todos eles são portugueses como nós, ELEITOS POR NÓS. Nascidos aqui, não noutra parte...

Fico triste.

Porque, ainda que Sócrates se fosse embora hoje, o próximo que o suceder terá que continuar a trabalhar com a mesma matéria prima defeituosa que, como povo, somos nós mesmos.

E não poderá fazer nada...

Não tenho nenhuma garantia de que alguém possa fazer melhor, mas enquanto alguém não sinalizar um caminho destinado a erradicar primeiro os vícios que temos como povo, ninguém servirá.

Nem serviu Santana, nem serviu Guterres, não serviu Cavaco, nem serve Sócrates e nem servirá o que vier.

Qual é a alternativa ?


Precisamos de mais um ditador, para que nos faça cumprir a lei com a força e por meio do terror ?

Aqui faz falta outra coisa. E enquanto essa 'outra coisa' não comece a surgir de baixo para cima, ou de cima para baixo, ou do centro para os lados, ou como queiram, seguiremos igualmente condenados, igualmente estancados... igualmente abusados !

É muito bom ser português. Mas quando essa portugalidade autóctone começa
a ser um empecilho às nossas possibilidades de desenvolvimento como Nação, então tudo muda...

Não esperemos acender uma vela a todos os santos, a ver se nos mandam um messias.

Nós temos que mudar. Um novo governante com os mesmos portugueses nada poderá fazer.

Está muito claro... Somos nós que temos que mudar.

Sim, creio que isto encaixa muito bem em tudo o que anda a acontecer-nos:

Desculpamos a mediocridade de programas de televisão nefastos e, francamente, somos tolerantes com o fracasso.

É a indústria da desculpa e da estupidez.

Agora, depois desta mensagem, francamente, decidi procurar o responsável, não para o castigar, mas para lhe exigir (sim, exigir) que melhore o seu comportamento e que não se faça de mouco, de desentendido.

Sim, decidi procurar o responsável e ESTOU SEGURO DE QUE O ENCONTRAREI QUANDO ME OLHAR NO ESPELHO.

AÍ ESTÁ. NÃO PRECISO PROCURÁ-LO NOUTRO LADO.


E você, o que pensa ?... MEDITE !


Eduardo Prado Coelho, in Público

17 setembro, 2009

08 setembro, 2009

Potsdamer Platz, Berlin den 6. September 2009

De regresso à praça que mais inspiração me deu na escrita. "Damals", tratava-se do ano mais intenso da minha vida, repleto de novos encontros. ("Tentando balançar", post de 2 de Janeiro de 2007).

Coisas que se assimilaram e absorveram de tal modo que hoje já são pretérito no pensamento. Sem querer, sem dever.

O tempo que passei nos opostos deste país inspirou-me a voz para falar das diferenças que um duro muro decalcou em jovens, mesmo duas décadas depois de ter caído. A inspiração que me trouxe uma viagem compensada até esta capital misteriosa, onde o flair é cinzento e se pisa História, tropeçando em locais escondidos, velhos e meio abandonados, onde pessoas de e em todas as cores vivem em Berlim.

Albânia, Sérvia e Alemanha foram os primeiros contactos na recepção do hotel (pago invisivelmente pelos nossos impostos). Cerca de 30 países representados facilmente se fizeram conhecer e partilharam histórias - ou estórias.

Desde a Estónia, com 19 anos, a vincar a paixão jornalística, até à Turquia, vinda da BBC de Londres carregada de experiência com microfones, passando por um professor primário do Chipre que, sem deixar que ninguém soubesse, era uma estrela de TV reconhecida nas ruas cipriotas, aqui a dançar connosco a qualquer batida berlinense.

A empatia de nacionalidades vivida em Leipzig, Bona, Colónia e Bruxelas revive-se aqui... instantaneamente. Portugal distancia-se, sem mal, da Espanha e da Itália para se refugiar nas chuvosas Irlanda, Holanda e Alemanha.

A Alemanha, Kathrin de nome (um dos poucos decoráveis em meros quatro dias de intensa comunicação inter-direccional) estuda afincadamente, sem pressas, para ser jornalista. É freelance para Zeit online e foi a melhor de 60 candidatos alemães pela sua estória sobre Estados não-membros que trazem estudantes com vidas difíceis para terras germânicas.

A Irlanda, de sorriso genuíno, chama-se Anna Patton, viveu em Inglaterra, aqui em Berlim e agora em Bruxelas. Talvez nos tenhamos cruzado na Place Lux sem saber. E a Holanda é vencedor masculino, com o mesmo nome do Bram de Leipzig e Leuven, tem 31 anos e uma conversa alegremente adolescente. Também freelance, contou-nos que descobriu um dia a existência do vinho do Porto. Contactou uma revista feminina, uma revista de vinhos e outra de viagens a propor o material. Depois falou com a companhia aérea a propor publicidade em troca do bilhete de avião... e assim seguiu para uma degustação no Douro.

Os protagonistas vinham do Leste Europeu, novos, candidatos ou potenciais candidatos a Estados -Membros, promovidos pela Direcção-Geral de Alargamento da Comissão Europeia - que lançou o concurso e ao qual agradecemos pela riqueza deste encontro.

Um outrora alemão de leste conta-nos, numa excursão personalidzada, como foi preso depois de ter tentado fugir para a Alemanha Ocidental. Tinha 18 anos e o plano feito nos 4 anteriores. Aparentemente, diferenças físicas no comboio foram suficientes.

Um deputado alemão do SPD encosta a política para nos falar, no Bundestag, da experiência pessoal de quem se lembra do próprio país dividido por tijolos e arame farpado. Pergunto-lhe se, enquanto cidadão alemão, foi difícil lidar com a imagem negativa que o globo espelha dos alemães, ao que responde com um olhar paciente. O tempo há-de trazer-lhes de novo o orgulho pela terra-mãe.

À descoberta de Berlim sobre os pedais de bicicletas alugadas, com olhares curiosos sobre os imponentes restos de muro, pintados agora nas cores da East-side gallery. À descoberta da gastronomia turca que aqui se instalou no pós-guerra. À descoberta de Berlim por barco, à descoberta da representação da Comissão Europeia junto às portas de exlibris e sobretudo à descoberta de histórias vindas de todos os cantos da Europa.

Prémio Europeu de Jovens Jornalistas - valeu a pena todas as horas sacrificadas em Bruxelas. Em busca de Ossis e de Wessis.

30 julho, 2009

Da "observadora compulsiva"

Vi as promessas do Sócrates em imagens silenciosas, que com outras semelhantes poluem a minha Lisboa.
Vi um mendigo dormir numa sombra na Praça de Espanha, a meio de uma tarde quente de Verão.
Vi Lisboa pela ponte 25 de Abril.
Vi muitos turistas no metro. Tive vontade de ir lá dizer-lhes "é linda a minha cidade, não é?"
Vi jornais desportivos a tapar os quiosques e cansei-me da gripe A, mais do que do Sócrates.
Vi linguadinhos, choquinhos e lulinhas nos menus dos restaurantes.
Ouvi muitos palavrões em conversas feias, numa esplanada em Cascais.
Ouvi a conversa toda de uma senhora que, no autocarro, falava com alguém ao telemóvel com alta voz.
Vi mais pedintes do que estava habituada a ver.
Comprei a Cais.
Redescobri a maresia.
Calcei as havaianas e senti o cheiro a sardinhas assadas sobre a calçada portuguesa.


O sabor de estar em casa - esse ninguém mo tira.

16 julho, 2009

Déjà vu


Não pensei voltar a sentir o mesmo que sentimos todos, de mãos dadas, em Julho de 2007, no Kulturbundhaus em Leipzig, ao som de Oasis. Uma alegria tão grande, uma saudade tão antecipada. "I feel so happy I could cry".

Estes cinco meses e aquele ano tiveram as suas diferenças, claro. Sobretudo pelo peso institucional. Eramos 600 estagiários num auditório gigante na Place Flagey. Sentíamo-nos deslocados entre aquela roupa formal, não eramos nós e tínhamos sede de soltar a naturalidade. Todos nnos sentíamos especiais e a maioria de nós até inferiores. Qualquer um ao nosso lado teria uma experiência de vida aparentemente mais interessante do que a nossa. Mas no fundo todos nós tínhamos razão para estar ali: fomos 600 escolhidos entre 6000 pré-seleccionados.

Daí a sede de absorver a experiência. A Comissão Europeia, aqui, passou a mero pretexto. Pano de fundo. Fundo para críticas e piadas. Como se nós fossemos melhores que todos eles juntos, fixos no seu contrato. Todos mostrámos garras de trabalhar, de ver, aprender e retirar o melhor desta oportunidade de sonho: entrar nos bastidores da Europa. Bruxelas não tem nada de Bélgica. Conheci uma única pessoa natural de Bruxelas. Bruxelas é uma panóplia de línguas, são aviões, badges, eurocratas, culturas que nos fazem pairar na ambiguidade entre choque absoluto e essa idealizada... União.

Tal como em 2006, saio daqui com culturas novas no coração e no sangue, sob forma de nomes. A incerteza quanto ao futuro é universal. Sabemos apenas que queremos manter-nos unidos. União Mundial. União Europeia. União Umbilical.

10 julho, 2009

O estado do país - por MST


«
Segunda-feira passada, a meio da tarde, faço a A-6, em direcção a Espanha e na companhia de uma amiga estrangeira; quarta-feira de manhã, refaço o mesmo percurso, em sentido inverso, rumo a Lisboa. Tanto para lá como para cá, é uma auto-estrada luxuosa e fantasma. Em contrapartida, numa breve incursão pela estrada nacional, entre Arraiolos e Borba, vamos encontrar um trânsito cerrado, composto esmagadoramente por camiões de mercadorias espanhóis. Vinda de um país onde as auto-estradas estão sempre cheias, ela está espantada com o que vê:

- É sempre assim, esta auto-estrada?
- Assim, como?
- Deserta, magnífica, sem trânsito?
- É, é sempre assim.
- Todos os dias?
- Todos, menos ao domingo, que sempre tem mais gente.
- Mas, se não há trânsito, porque a fizeram?
- Porque havia dinheiro para gastar dos Fundos Europeus, e porque diziam que o desenvolvimento era isto.
- E têm mais auto-estradas destas?
- Várias e ainda temos outras em construção: só de Lisboa para o Porto, vamos ficar com três. Entre S. Paulo e o Rio de Janeiro, por exemplo, não há nenhuma: só uns quilómetros à saída de S. Paulo e outros à chegada ao Rio. Nós vamos ter três entre o Porto e Lisboa: é a aposta no automóvel, na poupança de energia, nos acordos de Quioto, etc. - respondi, rindo-me.
- E, já agora, porque é que a auto-estrada está deserta e a estrada nacional está cheia de camiões?
- Porque assim não pagam portagem.
- E porque são quase todos espanhóis?
- Vêm trazer-nos comida.
- Mas vocês não têm agricultura?
- Não: a Europa paga-nos para não ter. E os nossos agricultores dizem que produzir não é rentável.
- Mas para os espanhóis é?
- Pelos vistos...Ela ficou a pensar um pouco e voltou à carga:
- Mas porque não investem antes no comboio?
- Investimos, mas não resultou.
- Não resultou, como?
- Houve aí uns experts que gastaram uma fortuna a modernizar a linha Lisboa-Porto, com comboios pendulares e tudo, mas não resultou.
- Mas porquê?
- Olha, é assim: a maior parte do tempo, o comboio não 'pêndula'; e, quando 'pendula', enjoa de morte. Não há sinal de telemóvel nem Internet, não há restaurante, há apenas um bar infecto e, de facto, o único sinal de 'modernidade' foi proibirem de fumar em qualquer espaço do comboio. Por isso, as pessoas preferem ir de carro e a companhia ferroviária do Estado perde centenas de milhões todos os anos.
- E gastaram nisso uma fortuna!
- Gastámos. E a única coisa que se conseguiu foi tirar 25 minutos às três horas e meia que demorava a viagem há cinquenta anos...
- Estás a brincar comigo!
- Não, estou a falar a sério!
- E o que fizeram a esses incompetentes?
- Nada. Ou melhor, agora vão dar-lhes uma nova oportunidade, que é encherem o país de TGV: Porto-Lisboa, Porto-Vigo, Madrid-Lisboa... e ainda há umas ameaças de fazerem outro no Algarve e outro no Centro.
- Mas que tamanho tem Portugal, de cima a baixo?
- Do ponto mais a norte ao ponto mais a sul, 561 km.
Ela ficou a olhar para mim, sem saber se era para acreditar ou não.
- Mas, ao menos, o TGV vai directo de Lisboa ao Porto?
- Não, pára em várias estações: de cima para baixo e se a memória não me falha, pára em Aveiro, para os compensar por não arrancarmos já com o TGV deles para Salamanca; depois, pára em Coimbra para não ofender o prof. Vital Moreira, que é muito importante lá; a seguir, pára numa aldeia chamada Ota, para os compensar por não terem feito lá o novo aeroporto de Lisboa; depois,pára em Alcochete, a sul de Lisboa, onde ficará o futuro aeroporto; e, finalmente, pára em Lisboa, em duas estações.
- Como: então o TGV vem do Norte, ultrapassa Lisboa pelo sul, e depois volta para trás e entra em Lisboa?
- Isso mesmo.
- E como entra em Lisboa?
- Por uma nova ponte que vão fazer.
- Uma ponte ferroviária?
- E rodoviária também: vai trazer mais uns vinte ou trinta mil carros todos os dias para Lisboa.- Mas isso é o caos, Lisboa já está congestionada de carros!
- Pois é.
- E, então?
- Então, nada. São os especialistas que decidiram assim.
Ela ficou pensativa outra vez. Manifestamente, o assunto estava a fasciná-la.
- E, desculpa lá, esse TGV para Madrid vai ter passageiros? Se a auto-estrada está deserta...
- Não, não vai ter.
- Não vai? Então, vai ser uma ruína!
- Não, é preciso distinguir: para as empresas que o vão construir e para os bancos que o vão capitalizar, vai ser um negócio fantástico! A exploração é que vai ser uma ruína - aliás, já admitida pelo Governo - porque, de facto, nem os especialistas conseguem encontrar passageiros que cheguem para o justificar.
- E quem paga os prejuízos da exploração: as empresas construtoras?
- Naaaão! Quem paga são os contribuintes! Aqui a regra é essa!
- E vocês não despedem o Governo?
- Talvez, mas não serve de muito: quem assinou os acordos para o TGV com Espanha foi a oposição, quando era governo...
- Que país o vosso! Mas qual é o argumento dos governos para fazerem um TGV que já sabem que vai perder dinheiro?
- Dizem que não podemos ficar fora da Rede Europeia de Alta Velocidade.
- O que é isso? Ir em TGV de Lisboa a Helsínquia?
- A Helsínquia, não, porque os países escandinavos não têm TGV.
- Como? Então, os países mais evoluídos da Europa não têm TGV e vocês têm de ter?
- É, dizem que assim entramos mais depressa na modernidade. Fizemos mais uns quilómetros de deserto rodoviário de luxo, até que ela pareceu lembrar-se de qualquer coisa que tinha ficado para trás:
- E esse novo aeroporto de que falaste, é o quê?
- O novo aeroporto internacional de Lisboa, do lado de lá do rio e a uns 50 quilómetros de Lisboa.
- Mas vocês vão fechar este aeroporto que é um luxo, quase no centro da cidade, e fazer um novo?
- É isso mesmo. Dizem que este está saturado.
- Não me pareceu nada...
- Porque não está: cada vez tem menos voos e só este ano a TAP vai cancelar cerca de 20.000. O que está a crescer são os voos das low-cost, que, aliás, estão a liquidar a TAP.
- Mas, então, porque não fazem como se faz em todo o lado, que é deixar as companhias de linha no aeroporto principal e chutar as low-cost para um pequeno aeroporto de periferia? Não têm nenhum disponível?
- Temos vários. Mas os especialistas dizem que o novo aeroporto vai ser um hub ibérico, fazendo a trasfega de todos os voos da América do Sul para a Europa: um sucesso garantido.
- E tu acreditas nisso?
- Eu acredito em tudo e não acredito em nada. Olha ali ao fundo: sabes o que é aquilo?
- Um lago enorme! Extraordinário!
- Não: é a barragem de Alqueva, a maior da Europa.
- Ena! Deve produzir energia para meio país!
- Praticamente zero.
- A sério? Mas, ao menos, não vos faltará água para beber!
- A água não é potável: já vem contaminada de Espanha.
- Já não sei se estás a gozar comigo ou não, mas, se não serve para beber, serve para regar - ou nem isso?
- Servir, serve, mas vai demorar vinte ou mais anos até instalarem o perímetro de rega, porque, como te disse, aqui acredita-se que a agricultura não tem futuro: antes, porque não havia água; agora, porque há água a mais.
- Estás a dizer-me que fizeram a maior barragem da Europa e não serve para nada?
-Vai servir para regar campos de golfe e urbanizações turísticas, que é o que nós fazemos mais e melhor. Apesar do sol de frente, impiedoso, ela tirou os óculos escuros e virou-se para me olhar bem de frente:
- Desculpa lá a última pergunta: vocês são doidos ou são ricos?
- Antes, éramos só doidos e fizemos algumas coisas notáveis por esse mundo fora; depois, disseram-nos que afinal éramos ricos e desatámos a fazer todas as asneiras possíveis cá dentro; em breve, voltaremos a ser pobres e enlouqueceremos de vez.
Ela voltou a colocar os óculos de sol e a recostar-se para trás no assento. E suspirou:
- Bem, uma coisa posso dizer: há poucos países tão agradáveis para viajar como Portugal! Olha-me só para esta auto-estrada sem ninguém!
»


Miguel Sousa Tavares, in Expresso


02 julho, 2009

Do meu terraço

Vejo as estrelas e lembro-me das noites adolescentes no Algarve.
Converso com o norte e apercebo-me das diferenças. Frustra-me não poder mudar. A mentalidade, o sistema, as pessoas, a minha própria mente.
Tu que me persegues, questionas-me sobre o futuro. O futuro que a tua gente não gosta de viver... mas que te persegue. É uma peste.
Tinha saudades de momentos nossos, em silêncio. Só eu e tu, bafo de Verão, a recordar os segredos dessa adolescência.
Tentas proteger-me da verdade cruel sobre este mundo, como se fosse mais simples viver sobre cores. Se me esconderes, porém, nunca me vais abrir os olhos.,,
E será que eu queria tê-los aberto? Estava tão bem na minha inocência. Agora estou presa neste ciclo ambicioso e ambíguo. Forte e fraco. Demais para mim!
Fizeste-me esquecer que podia ainda ser uma adolescente; bastava querer. Não teria conhecido nada disto, disto para onde me acompanhaste, e assim seria tão mais simples.

"Conhecendo a gente quer mais, não conhecendo a gente se satisfaz".

Agora tens as expectativas demasiado altas sobre mim. Nós, estes tantos no mundo que fazemos conquistas à nossa escala, acabamos por ser tão fracos. E se tu sabias que eu não tinha força sobre mim mesma, por minha conta, sozinha, por que confiaste assim em mim?
O que merecias agora é que eu te passasse tudo para as mãos. Decide por mim, que eu não consigo.
Bafo quente que não me deixas respirar...
Vai chover,
de Verão,
de vida,
chora Verão e refresca-me que preciso.

21 junho, 2009

Um olhar holandês sobre a costa alentejana

"Deborah, por que te preocupas com a tua vida profissional?"


Reacção a esta fotografia:




Na Holanda é assim:

trabalho trabalho trabalho trabalho trabalho
carreira carreira carreira carreira carreira
dinheiro dinheiro dinheiro dinheiro

- Comprar uma casa na Holanda

continuar a trabalhar trabalhar trabalhar trabalhar
fazer carreira carreira carreira carreira carreira
mais dinheiro mais dinheiro mais dinheiro mais dinheiro

- Comprar uma casa em Portugal

O que é que estás a fazer aqui???


Arjen van Kampen, colega na CE

02 junho, 2009

Sempre entre o cá e o lá

As rotinas de outros mundos, como uma tarde de feriado no parque. Oiço árabe, francês, inglês. Também ponho a pele à mostra a cada raio de sol que surge.

Por minha conta. Perigosamente me habituei a passar tempo comigo mesma e a baralhar ideias sobre o que me rodeia.

O Berlaymont fez parte da minha rotina durante estes 5 meses que, de tão rápido que passam, parecem já ter acabado. Tanta gente, tantas línguas, tantas folhas de informação, tantos programas diferentes. É tão simples fazer amigos aqui. E tão genuíno.

Dizia eu no início que Bruxelas tem vidas que inspiram. O meu sangue outrora caseiro tem tanta, tanta sede de conhecer mais agora. E nunca o paradoxo foi tão grande. Quero voltar a conhecer cidades desde o início, começar vidas novas em sítios novos. Quero infiltrar-me na rotina de Dublin, quero passear na Escandinávia, explorar o Canadá, deixar-me convencer pela Austrália e quero cumprir o meu sonho em Nova Iorque.

Onde está o paradoxo?

Quero ir para Casa.

20 maio, 2009

19 maio, 2009

O negativo do centro

Berlaymont fire out
By Simon Taylor
18.05.2009 / 13:35 CET
Officials hope to re-open the building on Tuesday.


A fire that broke out today in the European Commission's headquarters building, causing the evacuation of thousands of staff, is now extinguished, the Brussels fire brigade declared this evening. The fire broke out shortly before 1pm and was put out shortly before 5pm.

Francis Boileau, spokesman for the Brussels fire brigade, said the fire started in the basement of the Berlaymont and spread up an internal shaft. It triggered an automatic alarm on the 13th floor of the building where European Commission President José Manuel Barroso has his office.

Boileau said that the fire had ignited roofing materials on the top of the building and caused the smoke which could be seen emerging from the Berlaymont.


Johannes Laitenberger, European Commission spokesman, said that Barroso had been evacuated down the emergency stairs.

The surrounding roads were closed to traffic, while 40 firefighters tackled the fire. The firefighters are still examining the building with thermal cameras to check that there are no remaining hotspots that might cause a fire to break out again.



Stephen Hutchins, director for security at the Berlaymont, said that the fire alarm had been triggered at 12.50pm. Security personnel checked to make sure that the alarm was genuine and an order to evacuate the building was given at 13.05pm.

Laitenberger said that the evacuation had gone smoothly. There were no injuries, he said. He added that the cause of the fire was still unknown.

Staff will not be allowed back into the building until at least Tuesday (19 May) afternoon.

There are usually around 2,000 people working in the Berlaymont but the number was estimated to be smaller today as this is a holiday week with the Commission closed on Thursday and Friday.

Laitenberger said that commissioners who were in Brussels this week would be able to continue working in other buildings. Hutchins said that the Commission had a business continuity plan which identified key staff to be accommodated in other officers in the case of emergencies.

Commission staff were not being allowed to re-enter the building until the fire brigade declared it safe. There is no electricity in the building because the chief fire officer ordered the current and gas supply to be cut off when tackling the blaze. The lifts do not work and there is no lighting in the stairs.

The section of Boulevard Charlemagne in front of the Berlaymont, which was closed when the building was evacuated, has now been re-opened.



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15 abril, 2009

O que foi tão bom quanto cansou em menos de três anos.

Tarostrasse, 5 meses

Frommannstrasse, 4 meses

Julio Dinis, uma vida, 4 meses

Weberstrasse, 6 meses

Römerstrasse, 5 meses

Konviktstrasse, 1 mês

Georges Henri, 1 mês

Oltermont, 1 semana

Vandenbroeck, contrato de 4 meses

03 abril, 2009

O vai-vem com escala em Bruxelas


Bruxelas tem vida.
Bruxelas tem vidas, e que vidas!
Ele foi o primeiro choque. Nasceu na Croácia, cresceu em Itália, tirou Economia no Canadá, mestrado em Maastricht, está a fazer este estágio na Comissão Europeia e… tem a minha idade.
Mas as histórias assemelham-se. Ela é romena, mas aos 7 anos mudou-se para a França e estudou direito em Inglaterra. Quem a ouve falar não percebe qual é a sua língua materna.
Já a holandesa com quem vou viver é apaixonada por países sub-desenvolvidos. Tem 25 anos e nunca trabalhou ("student jobs" todos eles têm, estou a falar de trabalho a sério), porque quer investigar, saber, estudar. Formou-se em Amesterdão, fez Erasmus em Inglaterra e já perdi a conta dos países em que fez pesquisa ou trabalhou como embaixatriz de estudantes holandeses: Espanha, México, Gana.
Companheira lusófona! Carioca genuína com samba e jornalismo no sangue. Formada nos Estados Unidos, trabalhou em Nova Iorque e Miami. Fez mestrado em Espanha e trabalhou como jornalista por uns anos na Colômbia.
Querem que continue?
A minha bailarina de Salsa é natural das Canárias. Quando a conheci, falando em inglês, nunca imaginei que fosse espanhola: era a primeira que encontrei sem sotaque. Determinada nos seus argumentos, foi para Inglaterra especializar-se em conflitos e depois esteve uns meses em França – a falar francês também não tem sotaque. Conheceu a carioca na Colômbia e são grandes amigas. A primeira coisa que fez quando chegou a Bruxelas foi inscrever-se num ginásio, onde vai três vezes por semana. Está revoltada porque a cantina da Comissão não faz desconto para vegetarianos.
A belga loirinha de olhos azuis que me acolheu em sua casa por uns dias (até o meu novo lar estar livre) não é especialista em ciência política nem direito ou estudos europeus. É uma bióloga amiga do ambiente, necessária na Comissão, que me ensinou a separar o lixo convenientemente. Comentou comigo ter pena de não ter feito Erasmus. Por melhor que seja Erasmus, será que uma jovem que fez pesquisa nas Maurícias, no Congo, nas Seychelles e em França pode dizer que tem pena de alguma coisa? Também ela corre pelo parque sempre que pode, come fruta e bebe chá ao pequeno-almoço. E é paciente a corrigir os meus erros de francês.
Aquele rapaz que soa a English native-speaker? Nunca teria adivinhado que fosse austríaco, com estudos feitos no Canadá e noivo de uma mexicana. E a minha companheira alemã estudou na Holanda primeiro, fez Erasmus na Suécia, e fez um mestrado - metade na Polónia e outra metade nos Estados Unidos. Não me perguntem quantas línguas fala.
Mesmo que ouse perguntar-me o que estou a fazer aqui, a verdade é que estou, por mérito próprio. Não me vou esquecer do momento em que, na minha pátria, partilhei feliz a minha conquista e ouvi um "mas quem é que tu conheces na Comissão?" como resposta.
São apenas algumas das 600 histórias dos stagiaires arrived in Brussels. E todos nós estamos ainda incrédulos por possuir um "badge" que nos permite entrar nos edifícios das Instituições Europeias e filtrar a polícia mesmo em dias de Cimeira.
Bruxelas tem vidas que inspiram!

27 fevereiro, 2009

Change, move, go






De volta à mudança, ao movimento, ao modo de estar "em andamento". Frenético e desgastante, foi esse o ritmo que a levou de novo para um novo além-fronteiras. Nova cidade, novo país, nova língua, novo mundo. Ironicamente, o "cá longe" pareceu agora mais perto, mas nem por isso mais fácil...

Well, let's go!

26 fevereiro, 2009

Karneval in Köln, 2009



AS DUAS, UM ANO DEPOIS... DE FOLGA


O QUE FAZEM AS DROGAS


O "ZUG" (COMBOIO DO DESFILE) QUE DISTRIBUÍA DOCES... E EU, A APANHÁ-LOS TODOS


UM MENINO VAI À ESCOLA... ÀS 3 DA MANHÃ


UM CROCODILO...


UM SAPO-PRÍNCIPE


COLEGAS DE MEDICINA DA REPÚBLICA CHECA


UM BRANCO DE NEVE


O CHEFE... MASCARADO DE CRISE FINANCEIRA - É FAVOR REPARAR NA CASINHA NO TOPO DO CHAPÉU, O SECTOR IMOBILIÁRIO

EU QUERIA TER SERVIDO AS CANECAS DE UM LITRO, MAS ESTAMOS EM COLÓNIA, NÃO NA BAVIERA...



UM BRINDE AO CARNAVAL DE COLÓNIA!

03 fevereiro, 2009

Menschen

Nem sempre é fácil lidar com elas.

29 janeiro, 2009

Home

Essa tal mobilidade dos jovens.
No seu sentido literal, pensando em malas que vão aumentando e sendo transportadas a cada "xis" meses, pode cansar. Cansa, de facto.
Mas compensa, mesmo que por um único mês nos sintamos bem em CASA.




(Logo esta, que até fica na "Rua convicta, n.º 7")

18 janeiro, 2009

Aquele medo


O espaço entre as palavras, de tanto se alastrar, condensou-se. De repente fazem-se balanços entre palavras escritas e ditas. Olham-se os meses de relance para os dividir em partes. Partes de aventura, de nostalgia, de hesitação, de sol, de frio, de regresso, de tensão, de medo. Cada uma delas floreia as letras com que se escrevem as palavras. As palavras descritivas dos desafios que vão passando.



Começou por um começo floreado, um arranque merecido, um medo abafado pelo desejo de voltar a sentir a conquista do desconhecido numa terra, já de si, feliz. E a sensação de dever cumprido e de aprendizagem fez crescer a vontade de permanecer nesse desconhecido. A vontade arrasta a força. E só essa força conseguiu aguentar as duas estações do ano com luz em ritmo decorado, repetitivo, cansativo até dizer fim. Quando a força esgotou, disse-se fim para recuperar a força de começar algo de novo.



Voltou a compensar a decisão, mas não o peso de toda a hesitação e cansaço para tomá-la, sozinha. E aprende-se a confiar no nosso interior, por meio desse isolamento, por vezes em forma de solidão. Dizem que é assim... para o bom ou para o mau, com tudo se aprende.



E se cresce.



Cresce-se para ambicionar, para tentar, conquistar por vezes, cresce-se para dar de caras com verdades difícieis de acreditar, para acinzentar as cores, para ficar perto e longe, aos saltos, aos poucos, para ganhar consciência de algumas coisas e ganhar pressão sobre outras. Entra-se no ciclo do mais e mais e mais longe, para se ver quem não olha a limites, quem não olha a meios, quem não olha a princípios.



E dentro do ciclo reduz-se e aumenta-se o espaço entre palavras, as palavras que descrevem ínícios, recomeços, novas decisões, novos desafios, novos medos.



Que, no ano que entrou, "se for para perder, que seja o medo."