18 janeiro, 2006

Amálgama


Detesto. Sentir-me assim, dar-me para ser assim, ter saído assim. Tão pura numas coisas, tão rancorosa noutras, paciente, impaciente, revoltada, amiga, inimiga, dedicada, egoísta. Impulsiva. Aquela grande árvore da Amizade que me deu tantos frutos na adolescência, tanto papel, que atirei um dia pela varanda fora, sem hipótese de reciclagem. Não voltaria atrás, nem volto, nunca, porque sei que os frutos estavam artificiais, com uma cor pouco natural. Então não me arrependo. E no entanto tenho remorsos. De não ter sido outra pessoa, mais tolerante, mais pacífica, mais compreensiva. Ouviria, choraria, mas talvez desse o abraço apertado que há dois dias me faria ter-lhe ligado a dar os parabéns. Não dei. É um dia penoso. Sê-lo-á para sempre.

Hoje, pareço gostar de repeti-lo. Não que tenha estagnado, pois sinto-me diferente. Sem dúvida, aprendi e cresci muito. É a inevitabilidade merecida do sofrimento. Mas porque os meus princípios são os mesmos. Ainda que tenha conseguido mudar de atitudes, continuo a revoltar-me com as mesmas pequenas coisas. Enervo-me, bloqueio, não perdoo, não dou espaço de manobra. Sou cruelmente fria. E olho para o lado, onde aqueles que adoro, que são tantos!, recebem toda a minha transparente dedicação.

Gostava de acreditar que tudo isto é genuinidade. É revolta contra o cinismo que já me rodeou tantas vezes, ao longo de tantos anos. Gostava de me orgulhar deste sentimento, que é cubo de gelo, mas também é natural, puro, sem sombras nem turvação. Não gosto de me contradizer e por isso sigo uma dialéctica que acaba por me atormentar. Gostava de ser criança outra vez, onde tudo à minha volta seria assim, coloridamente transparente. Gostava de cantar e sorrir sem imaginar a possibilidade de ficar sem aquela amiga, ou aquelas amigas, ou aqueles amigos, de quem e por quem tanto esperei. Já perdi muita coisa assim.

Hoje, sinto-me a seguir com firmeza essa directriz. Não mudo, porque não quero mudar. Sei que só assim posso garantir a minha sinceridade, ainda que desejasse (tanto!) não sentir as coisas assim. Há tantos que vejo que conseguem, belos e puros… Ora, não caiam no erro de o pretenderem de mim. Desiludam-se, afinal virei costas, já não sinto aquele carinho amigo. É pena, mas pode acontecer. Não sei como evitá-lo.

Hoje, sim, olham-me de lado, não me entendem ou não me reconhecem. Os segredos quebraram-se. Continuo a mesma, mas perante uma só figura consegui mudar de postura. Sem razão aparente. Apenas porque me irrita, ilegitimamente me irrita. Hoje pedem-me satisfações, colam-se à arrogância de me aconselhar sobre o que supostamente não saberia que era devido saber. Hoje perdem o interesse. Hoje, para amanhã o substituírem por aquele “nunca percebi o que se passou”.

Àqueles a quem um dia posso tratar mal, que são mais do que eu própria imagino, perdoem-me desde já. Eu não queria ser assim
.

10 comentários:

mj disse...

Como me fez sentido este texto
Tanto.......

beijo e não acredito que os nossos segredos algum dia se quebrem.

Catarina disse...

Fizeste-me chorar. Foi talvez um dos teus mais pequenos textos, mas foi também aquele que mais me tocou.
Talvez porque em cada palavra que escreves eu sinto um pouco daquilo que tu sentes.
Por vezes penso que sou só eu que acho que as coisas devem ser assim. Que as pessoas devem ser frontais. Não ter medo.
Até há pouco tempo atrás vivi num mundo que julgava não viver. E tudo se escondia sem eu nunca pensar sequer que estaria lá.
Ouvi muitas coisas, chorei muito. Mas CRESCI. Doeu, e vai continuar a doer, mas cresci.
E contigo vejo-me também a crescer. E vejo crescer aquilo que nos une. A amizade e "aquele" sentimento de inconformismo, de querer que as coisas resultem da melhor forma.
Não me vejo sozinha. E quero que estejas sempre comigo. Porque nós, que recentemente tivemos essas experiências sabemos que dói.
Mas alegro-me por saber que crescemos as duas. E que batalhamos as duas.
Admiro-te tanto.
*Beijos*

Anónimo disse...

eu gosto de ti assim...a minha amiga que vejo "coloridamente transparente"...em sintonia!
beijinho enorme

Anónimo disse...

Percebo-te tão tão bem!
Não tenhas pena de não ser diferente, apesar de saber k às vezes dói de mais ser assim.
A sério, tinha tanto para te dizer, mas nem consigo.

Deixo então um beijinho, daqueles que dava quando era criança

Caramela disse...

Que posso dizer? És assim, desde que me lembro de ti sempre o foste.
Sincera, frontal... diferente.
Não é um cubo de gelo, é demasiado liquido, no entanto muito estático.
És quem és: tu, e é isso que interessa! Para o bom ou para o mau. Não peças desculpas por seres qum és.

ARN disse...

Quem te conhece e gosta de ti, vai saber superar diferenças e rosolver desentendimentos... nunca serás uma má da fita!
Chefe rakel

Anónimo disse...

Olá miúda...
É realmente isto que faz de ti aquilo que és, aquilo que adoro que sejas!
Beijos enormes

Anónimo disse...

Como te admiro por seres assim... Por dizeres aquilo que sentes, quando sentes... És tu, my dear Tana, e é isso que te diferencia das outras pessoas! E quem gosta de ti, gosta de ti como és! Olha, eu gosto "mais qui demais!"Bjinhux!*

Anónimo disse...

Como te admiro por seres assim... Por dizeres aquilo que sentes, quando sentes... És tu, my dear Tana, e é isso que te diferencia das outras pessoas! E quem gosta de ti, gosta de ti como és! Olha, eu gosto "mais qui demais!"Bjinhux!*

Anónimo disse...

Desculpa ter repetido! Apaga um e este tb!*