30 junho, 2006

Uma geração desorientada

Escrevi este texto em Fevereiro passado e não sei ao certo por que não o publiquei na altura. Talvez a clara transparência, passe o pleonasmo, me fizesse crer que o deveria mostrar a quem o soubesse ler como o escrevi. Mas sujeita a esta eterna espera de feedback, e porque nada melhor do que esta fase de transição académica da minha vida, ei-lo

Fala-se em aposta na educação, em reformas no ensino superior, em jovens que farão o futuro do país. Aos poucos vemos o esforço relutante de dar as mãos entre o ensino e a tecnologia, na esperança de nos aproximar das invejadas “médias europeias”. Quem sabe, as crianças de hoje não venham mesmo a lucrar com isso?

Mas nós, os estudantes do ensino superior de hoje, de uma transição ainda não palpável, sentimo-nos descurados desse apoio. Aliás, são as falhas de que nos queixamos que alertam os governos para a necessidade de dar importância à educação dos jovens. Há pouco tempo, na Universidade Nova de Lisboa, onde estudo Ciências da Comunicação, uma Professora minha, ainda nova, mostrou-se muito surpreendida quando lhe contámos, seus alunos que rondam os 20 anos, ter sentido uma grande angústia no tempo em que nos era imposto seguir uma determinada área profissional. “Mas vocês chegam ao ponto de deixar que o medo da situação do mercado de trabalho influencie a decisão sobre o que querem fazer da vida?”, perguntou-nos, incrédula. Confessou, garantindo que a sua geração era unânime, não ter essa consciência.

É a mais pura verdade. Desde o tempo em que nos ensinam a importância da evolução tecnológica, fazendo da Revolução Industrial o grande passo da nossa História, parecem esquecer-se simultaneamente que é preciso darem-nos o espaço, a oportunidade e as condições para que façamos, um dia, História também. E no entanto sinto, juntamente com a maioria dos meus colegas, um desamparo desmedido que nos faz sentir que a única solução para vingarmos na vida passa por um dinamismo consciente da ausência de apoios. Resta-nos fazer e procurar, lutando contra os obstáculos que parecem só agora constituir uma “questão a estudar no plano legislativo”. Talvez para daqui a alguns anos.

Enquanto isso, porque não podemos perder tempo a esperar, resta-nos seguir esse caminho de pedras, buracos e poeira. Um caminho em que nos constituímos cidadãos como autodidactas, por não termos sobre nós o princípio, o exemplo. Se tanto lutam para que tenhamos uma infância feliz, longe das atrocidades que sabemos atacar crianças por todo o Mundo, violadas, exploradas e famintas, a verdade é que crescemos com uma maturidade fragilizada que não permite, a muitos, enfrentar as dificuldades da crua realidade prática da vida.

Quando julgamos sentir em nós a capacidade para “mudar o mundo”, depressa nos retiram esse alento, gritando-nos diariamente sobre as elevadas taxas de desemprego, acompanhadas da frase-desilusão “ainda tens muito que aprender nesta vida”.

Parece ser este o espírito perdedor de um povo de glórias passadas que viu o tempo correr e já não crê no retorno dos tempos áureos. E que culpa temos nós, jovens obrigados a estudar todas as datas que marcaram a magnificência portuguesa, que o caminho percorrido desde então por Portugal não tenha sido mais bonito, nós a quem pouparam a oportunidade de acreditar mais agora para viver melhor depois?

Desorientaram-nos porque se sentiram atraiçoados pela conjectura que os antecessores viveram. Fraquejaram com esta crise de identidade permanente, qual criança de um país de Terceiro Mundo que não pôde sentir a protecção à sua volta.

Hoje somos negativamente acusados de espírito revolucionário, de não nos esforçarmos, de deixarmos de estudar. Porquê? Porque sem um desenvolvimento motivador somos forçados a trazer esse dinheiro caro para casa, a trabalhar cedo para viver, e não a trabalhar para cultivar outros sonhos. Aos que tiveram um berço mais feliz mas apenas aos que sabem valorizá-lo, é possível pegar em alguns tostões e alargar horizontes, procurar oportunidades além-fronteiras, ir. São esses ou os que sonham com isso que, quando abordados na rua pelos repórteres sobre o que fariam com o prémio do Euromilhões, respondem, sem hesitação e com um sorriso ambiguamente melancólico e determinado, “ia embora daqui”. São esses que, com uma frustração cada vez mais unida, parecem só saber gritar “Portugal!” a todo pulmão quando o futebol os faz esquecer que, aqui, não têm espaço para muito.

Não nos culpem por nos revoltarmos e querermos ir embora de um País que não nos ajuda.

2 comentários:

Caramela disse...

Parabéns! Ninguém o poderia ter dito melhor...

Anónimo disse...

Tens muita razão...
É o país que temos, para o bem e para o mal!
Beijinhos