20 março, 2007

Irgendwie, hoje


O dia em que, com grande coragem, pediu uma Bratwurst num quiosque da Henriettenplatz e, ao responder “ja” a uma pergunta que não entendeu direito, ouviu presumíveis menções a sua parca inteligência, seguidas de risadinhas e risadonas dos outros clientes do estabelecimento.

O dia em que, não conhecendo (e não a tendo achado no dicionariozinho) a palavra para designar “sacola”, limitou-se a apontá-la para a caixa do supermercado, a qual ficou imensamente transtornada e começou a discursar… - das ist kein dah-dah-dah-dah! Das ist kein buh-buh-buh-buh! Das iste eine Tüte! Das ist eine Tüüüüte, ja?

Sim, tudo isso é muito natural, não será isso que o desencorajará, um dia ele finalmente aprenderá a diferença entre welches, welche e welchem, um dia saberá pôr um verbo aqui e outro a duas milhas de distância, para isso vem estudando com afinco.

No Brasil, muitas vezes me queixo de que as pessoas falam alto demais,, se olham, se pegam, esfregam, abraçam e beijam demais. Já aqui, sinto uma espécie de privação sensorial. Penso em Montaigne que, se não me engano, escreveu que o casamento é como uma gaiola: o passarinho que está dentro quer sair, o que está fora quer entrar. Acho que isso pode estender-se a tudo na vida, porque hoje, particularmente, eu gostaria de ter voltado para casa com a sensação de que alguém na rua me viu, e fiquei com saudades de casa.

João Ubaldo Ribeiro, Um Brasileiro em Berlim


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